Dia 31 de Outubro
completou 1 ano em que eu dei a louca e resolvi
cortar anos de um estilo para descobrir um novo. Pense aí, você alisa
seu cabelo aproximadamente desde os 10 anos, acostumou-se com aquele padrão de
fio e em segundos deixa cair essa acomodação no chão do salão. Sim, fez 1 ano
do meu BC, big chop, ou melhor, “grande corte”.
Antes de contar como
foi esse primeiro ano, acho importante dizer como eu decidi “me libertar das
químicas de cabelo”. E não vou mentir e dizer que foi num ato decidido de
aceitação e de empoderamento negro. Na verdade, aconteceu de uma forma:
“Acho que poderia
fazer... Será? Fiz! Meu DEUS”.
Sempre tive relutância em voltar a ter meu cabelo de origem. Quando levantavam esse assunto, eu me escondia atrás dos argumentos de que era trabalhoso ou que se meus cachos fossem mais “domados” eu deixaria. Mas nessa época, eu nunca cheguei a me questionar se falava isso realmente porque achava isso, ou porque sempre fui condicionada a pensar dessa forma. Até que eu me encontrei dentro de um contexto que me permitiu questionar, ligar aquela pequena luzinha para pensar sobre. Estar em meio a meninas que faziam a transição me ajudou muito, muito mesmo encarar a minha. E não por querer imitar, ou ser “Maria vai com as outras”, mas por elas fazerem notar essa atitude que antes eu nunca tinha visto outras fazerem, e despertarem em mim a curiosidade e o questionamento: Como era meu cabelo? Por que eu aliso?
Transição! Oito meses sem química. |
Pronto. Oito meses após
meu último relaxamento e eu decidi, na doida, ainda com a batalha de “quero
experimentar, mas será que faço?” na mente. Não minto, foi um susto me ver com
um novo cabelo no espelho. E pior (ou melhor), a cabelereira perguntou só uma
única vez “posso cortar?” e quando eu assenti ela passou tesoura de uma vez no
rabo de cavalo. Não tinha mais volta. Eu olhava para mim e só pensava no que os
outros iam falar. Eu só pensava no cumprimento do meu cabelo que confesso
sempre foi algo que eu relutava em me desfazer. Confesso que no primeiro dia,
eu fiquei até evitando tocar no meu cabelo para não ter que sentir a realidade
e me arrepender. Poxa, porque essa reluta algo que era meu?
O dia do Grande Corte! |
contra todos os estereótipos que tinha dentro de mim, e que tinha em outros e eu absorvia. E acho que esse foi o maior aprendizado da transição e pós-BC: Redescobrir-se. Você não só redescobre uma estrutura capilar diferente. Mas redescobre outras milhões de belezas que você tinha e passavam despercebidas. Você descobre que tem mais autonomia para usar um brincão, uma sobrancelha arqueada, um batom de personalidade. Você se olha no espelho e brinca com a imagem que vê: “será você? Sou eu?”. E sim é uma nova você, uma nova eu. Eu gosto muito de indicar esse confronto. Vá para o espelho, se olhe, se encha de defeito, depois se pergunte por que você colocou esses defeitos, porque eles não são suas qualidades? Não há nada que possa tirar de bom e bonito dali? E eu tirei. Do meu reflexo eu tirei uma pessoa mais madura, um desafio de se valorizar, uma forma de dar para aquele novo cabelo e aquela nova Paula, um novo tratamento.
Que vão ter pessoas
para falar “aquele cabelinho”, sempre vão ter. Elas vão te desanimar nesse
percurso de aceitação e autoestima, vão. Mas as críticas estão ali apenas para
lembrar porque fizemos e mantemos essa nova atitude e visual: Para mostrarmos
que podemos ser quem quisermos e ninguém pode menosprezar isso, ou ditar o que
é bom ou não. Não precisamos de hierarquia de belezas, raça, ou o que for.
Somos o que somos e precisamos de respeito. E é mantendo quem somos, ou o que
nos rechaçam é que vamos resistindo.
Meu
incentivo:
Acho que a primeira
coisa que precisamos fazer é problematizar a nós mesmo. Caso você alise seu
cabelo, pergunte-se: Por que aliso? Por que não usaria meu cabelo natural? Eu
me importaria com a opinião dos outros?
Questione-se de forma a tentar mapear se a visão que você tem de crespos/cacheados não estão envoltas de um padrão social, de um condicionamento feito pela sociedade.
E quais
condicionamentos seriam esses? Achar que volume é problema; que estrutura não
definida é sinônimo de desarrumado, que cabelos para “cima” não é feminino, que
cabelo não liso é “pixain”, “cabelo de nego” (é sim e aí, deveria ser um
problema?), “é sujo”, diversos pensamentos que resvalam estereótipos racistas.
E sabe por que esses
condicionamentos estão errados? Porque existem estruturas capilares diferentes.
E mesmo assim, não quer dizer que um é melhor que outro. Essa ideia de “cabelo
bom/ruim” é puramente padrão social, feito láaaa atrás por nossos ancestrais
racistas. Cada cabelo tem sua característica.
Por isso quando
perguntam se meu cabelo dá trabalho, eu insisto que o trabalho que ele vai dá é
se você quiser buscar perfeição e definição e não aceitar todas as
características inatas que nosso cabelo tem. Tem frizz, é armado, te volume,
não vai ficar no lugar sempre.
Não devemos impor a
característica do cabelo liso no cabelo cacheado/crespo, como muitas vezes já
foi feito. E talvez, seja por isso que muitas meninas tem essa memória ruim com
seus cabelos. Porque na infância tiveram seus cabelos cuidados da forma “lisa”
e padrão de tratar. Penteando forçadamente e recendo puxões. Colocando para “se
comportarem” aqueles cachos que deveriam estar nas alturas. Recebendo críticas
dos coleguinhas quando se tinha um cabelo livre.
E convenhamos o problema
não são os cachos, crespo ou liso. Não é a estética em si, mas sim a ideologia
que ele leva ou implica. Eu alisava porque achava que era o padrão. Nunca
pensei além.
Eu só acho válido isso:
problematizar e tentar enxergar além sempre.
Vou dizer também que vejo
muito radicalismos dos dois lados, como se fosse uma briga de quem é melhor.
"Ah, proibido alisar", "ah agora é ditatura dos cachos, vamos
ficar alisadas mesmo", como se fosse birrinha, quando na verdade a luta
deveria ser para que todos aceitassem a nossa diversidade sem subjugar nem
enaltecer um padrão em detrimento de outro.
Mas me sinto orgulhosa
de ter desconstruído esse pensamento antigo. E se optar pelo liso hoje, ou
qualquer dia desses, não ter sido uma obrigação. Mas sim porque eu tenho a
opção de escolher o estilo que quero.
Por isso que temos que
redescobrir como cuidar e do que nossa juba precisa. E quem sabe até
experimentar a juba. Juba sim, porque nossos cachos são livres e isso não é
defeito.
Sobre
experiências:
- Até você encontrar os
produtos que se identifique, vai ser quase uma compulsão querer comprar
produtos e testá-los. Você vai virar a louca dos produtos de cabelo. Não vai aguentar uma sessão de cosmético no supermercado ou farmácia que irá direto para ela ver os produtos de Cachos;
produtos e testá-los. Você vai virar a louca dos produtos de cabelo. Não vai aguentar uma sessão de cosmético no supermercado ou farmácia que irá direto para ela ver os produtos de Cachos;
- Prisilhinhas, tiaras,
brincos, brincos, batom, muito batom, prisilhinhas e brincões. Outras
aquisições viciantes;
- Enquanto seu cabelo
cresce, TODA cacheada que você ver vai virar modelo de comparação: “Será que
meu cabelo é igual ao dela”. E sua amiga vai virar sua principal consultora para
te dar essa resposta;
- Quase um tic que eu
desenvolvi depois da transição é enrolar os cachinhos de trás. Gente, é
inconsciente, quando eu vejo eu já tô enrolando. Porém, alerta: Às vezes as
pessoas vão pensar que você tá flertando com elas. HAHA Gente, juro que não é;
- Fator encolhimento:
Seu cabelo cresce 2 cm e encolhe 5cm. Molhado ele está na bunda, seco vai parar
na orelha.
- Cabelo cacheado dá
trabalho? O trabalho que eu tenho é levar 2 a 3 vezes na semana, desembaraçar
no banho (acho que desembraçar é a parte mais trabalhosa, mas como liso também
era...), hidratar e pentear com os dedos, todo processo de finalização não leva
10 minutos. Dura 3 a 4 dias sem fazer nada, só uma passada de gel na frente ou
pente garfo para dar volume. De resto, é aceitar que meu cabelo é livre e
volumoso e vai ficar sem definição às vezes;
- E por falar nisso:
Nosso cabelo nunca será o mesmo que aparenta na transição. A estrutura pode ser
menor. Mas calma. Não é porque ele não vai ficar como você pensava que isso é
um problema. Sem hierarquia de estruturas, ok? Redescubra-se. E sem
descriminações com os tipos 4, nem todo cacho é perfeito, mas sim poderoso.
- Cachos 2abc são os
ondulados, 3abc os cacheados, 4abc os crespos. Nem todo cabelo é exclusivamente
um tipo. Pode ter várias misturas.
- Por mais que você
queira que outras pessoas também experimente essa atitude de se redescobrir, e
que passe pelas mesmas experiências que você, tenha cuidado em não criar uma
nova “ditadura”. Já cometi esse erro, confesso. E muita gente se sente
incomodada quando impomos algo para elas. Cada um tem seu livre arbítrio para
ser o que quiser e se identificar com o que quer. Só não vale menosprezar o
outro, nem criar hierarquias de “x é melhor que y”.
1 ANO! |
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